Era o ano de 1991.Cheguei em casa no desespero. Carregada de livros e pastas, mais um dia de trabalho como professora no centro da cidade do Rio de Janeiro, voltando pra casa de ônibus lotado, um inferno, salário ínfimo, contas acumulando, pouca comida na geladeira, solidão num apêzinho em Jacarepaguá,dois casamentos e uns tantos relacionamentos encerrados tristemente, longe de tudo e de todos, Longe principalmente do filho, que por diversas circunstâncias, inclusive financeiras, agora morava com o pai , nas lonjuras do Leme. Pra ele era muito melhor e pra mim era o verdadeiro significado da derrota. O preço da independência era alto e vinha me cobrar de relho na mão, todo dia.
Eu só tinha um pensamento naquela cabeça em rodopios: morrer.
Tudo tinha dado errado na minha vida, assim eu achava firmemente. Tudo doía em mim e eu tinha, naquele momento, um nervo exposto na alma.
Morrer.
Chorando, eu pensava em como.
Gás.
Pular da janela.
Cortar os pulsos.
O vento entrando pela porta aberta da sacada, sacudiu um jornal que eu tinha deixado jogado no chão da sala logo cedo, ao sair pra trabalhar. Uma página inteira anunciava: Próximo Domingo, 21 de abril , apresentação de Caetano Veloso em homenagem ao Dia da Terra, na enseada de Botafogo.
Enxuguei as lágrimas: antes de Domingo eu não podia morrer.
No céu, uma luazinha minguante boiava sobre o Pão de Açúcar. Caetano sozinho no palco, acompanhado apenas do violão, um banquinho e um microfone, pediu que todos sentássemos nas areias. E começou cantando Valsa de uma Cidade .
Chorando de mansinho eu compreendi profundamente uma frase que eu já dizia como bordão, há muito tempo: Só a Arte Salva.
Até hoje, ouvindo a música Paratodos do Chico eu lembro daquela noite em que não virei" passarinho avoando de edifícios" porque fui de Caetano na veia. Pra sempre.
#caetano80anos
https://www.youtube.com/watch?v=OXVc0zKwdds
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